Nasci em um lar tipicamente católico, desses onde o que importa é manter as tradições e não adorar e obedecer a Deus.
Até os treze anos eu freqüentava missas e comungava.
Em minha última fase como católico praticante, cheguei a ajudar a celebração de missas. Meu alvo era ajudar a missa mais concorrida de Fortaleza. Apenas o desafio de um garoto a si mesmo. Quando alcancei, perdi a motivação e desisti do romanismo.
Dos treze aos vinte e dois anos, me mantive completamente afastado de Deus. Profundamente materialista, só pensava em ganhar dinheiro.
Desde menino, quando me perguntavam o que eu queria ser, respondia: “rico”.
Não estava nem um pouco interessado nas coisas espirituais.
Quando em alguma conversa com amigos surgia assuntos relacionados com o destino após a morte, eu assumia ares de arrogância e falava da minha teoria, que por sinal pensava ser muito inteligente: na eternidade futura cada um se sentiria exatamente como na eternidade passada, antes de nascer.
Aos vinte anos, aproximadamente, quando no 3º. ou 4º. ano da Faculdade de Engenharia, passei por uma experiência marcante.
Durante a aula, um grupo de protestantes (como eu os chamava na época), pediram ao professor para distribuir entre os alunos exemplares do Novo Testamento. Eram Gideões. Depois que cada um ganhou o seu, a aula continuou normalmente. Eu estava sentado atrás da sala, a janela aberta, ao meu lado. Folheei o presente, não vi em que poderia me ser útil, olhei para um lado e para o outro, e com um gesto rápido joguei o Novo Testamento pela janela.
Conto isso não pelo prazer de mostrar até que ponto pode chegar a irreverência de um jovem rebelde.
Mas para louvar ao Senhor Jesus Cristo por ter transformado aquele jovem num escravo da mesma Palavra que um dia jogou fora.
Com vinte e dois anos, em dezembro de 1974, graduei-me em Engenharia Civil e, três dias depois, casei com Sandra, a garota pela qual estava apaixonado há seis anos.
Tornei-me sócio de meu pai Jimmy na tradicional empresa dele, de representações aeronáuticas.
Em suma, tinha tudo o que um homem da minha idade podia sonhar.
Hora de sentir-me realizado, vitorioso, feliz.
Mas aconteceu exatamente o contrário. Passei a me sentir meio vazio, inseguro.
Comecei a pensar o quanto o homem é frágil e fraco.
De repente comecei a me sentir profundamente incomodado com o fato do homem não ter controle das circunstâncias ao seu redor.
Hoje encontramos um amigo satisfeito, cheio de saúde; amanhã está sendo enterrado, com o crânio amassado numa batida de carro. Isso por certo não estava em seus planos. Quando seria a minha vez?
Minha teoria de aniquilamento total após a morte estava se aniquilando aos poucos em minha mente.
Os homens se arrogam grandes poderes, mas ficam só na arrogância mesmo.
Não tem poder de quase nada.
O homem mais poderoso do mundo, por exemplo, o presidente dos Estados Unidos, com milhares de soldados ao seu dispor, armas, bombas e tudo o mais, se ele amanhecer com uma unha encravada e inflamada, não vai conseguir nem andar. Onde está o seu poder pessoal?
Os homens inventam abrigos contra furacões. Por que não encontram uma maneira de afastar os furacões ou dissolvê-los com uma ordem?
Coitados, mal conseguem saber quando vem o furacão.
E os terremotos, que chegam de surpresa? Por que não mandam a terra se conter e parar de abrir crateras em plenas cidades?
Fazem pára-raios. Por que não impedem o raio de queimar suas casas ou de lhes transformar em tição?
Mesmo assim, os homens agem como se tivessem muito poder.
São extremamente orgulhosos e vaidosos das suas descobertas e do avanço da ciência. Comecei a ver INCOERÊNCIA entre o que os homens realmente são e o que pensam ou fingem que são. E eu, claro, incluído na análise.
Para mim, a resposta ia ficando cada vez mais clara: os homens simplesmente não têm o poder que dizem. Isso começou a gerar em mim uma grande insegurança. Minha alma passou a se sentir muito inquieta.
Muitas vezes ficava até altas horas da noite ouvindo rock no head-phone, ligado em alto volume, enquanto Sandra dormia. Além da música, procurei aliviar minhas angústias em calmantes (hoje se chama ansiolítico), tomados todo dia.
Olhando para trás, vejo que o Espírito Santo estava criando em meu coração uma necessidade que Ele próprio iria preencher logo depois.
Aqui entra em cena um servo de Deus: Harold Reiner.
Naquela época ele morava em Iguatu, interior do Ceará.
Por ter avião, era amigo de meu pai e de vez em quando passava pelo nosso escritório quando estava em Fortaleza.
Sempre demonstrava muita alegria. O ambiente ficava agradável quando estava por lá.
E eu comecei a pensar: Por que esse camarada demonstra tanta felicidade? O que ele tem que eu não tenho? E me interessei em conversar com ele.
Iniciamos uma fase de dois anos de conversas sobre assuntos espirituais. Às vezes passávamos horas conversando em meu gabinete. Eu ficava tão interessado que até deixava de atender telefone.
E não raro continuávamos a conversa noite a dentro, com muita pizza e Coca-Cola.
Ele regressava a Iguatu e voltávamos a nos encontrar algumas semanas depois.
Nesses encontros eu crivava o Haroldo de perguntas: dezenas, talvez centenas.
Foi crucial para mim perceber que ele nunca tentava me “enrolar” nas respostas.
Quando era uma pergunta complexa, cuja resposta não consta na Bíblia, tipo “Por que Deus permitiu o pecado?”, ele simplesmente dizia “Eu não sei.”
Eu fingia que estava decepcionado pela sua incapacidade de responder, mas no íntimo o meu respeito por ele aumentava e as suas palavras adquiriam mais peso.
(Com isso aprendi uma lição: não devemos levar tão a sério quando pessoas que estão sendo evangelizadas falam mal de Deus e da Bíblia. Muitas vezes é apenas desespero e resistência a se entregar a Cristo).
Um dia ele me deu uma Bíblia, oferecida por ele e Joana. Essa Bíblia é uma lembrança preciosa para mim, hoje. Entre uma conversa e outra com Haroldo, eu lia a Bíblia.
Não demorei a perceber que aquele livro era extremamente sério, diferente de tudo o que já lera antes.
Senti que teria que assumir alguma atitude com relação a ele.
Lendo os Evangelhos, comecei a me impressionar com o homem que era o personagem principal: Jesus.
Algumas passagens falavam forte ao meu coração.
Na adolescência, eu li alguns livros famosos na época - tipo “auto-ajuda” de hoje, como o best-seller Como Fazer Amigos e Influenciar Pessoas, de Dale Carnegie.
Um desses livros dizia para vivermos como se cada dia fosse um bloco, isolado do outro. Fiquei impressionado quando descobri que esses autores estavam simplesmente dizendo em outras palavras a mesma coisa que Cristo havia dito 2 mil anos antes - Mt 6.31-34.
Mas a passagem que maior impacto causou foi Mt 8.23-27, quando Ele acalma uma tempestade. No final, os discípulos perguntam, extasiados: Quem é este, que até os ventos e o mar lhe obedecem?
Aquela pergunta eu mesmo fazia! Isso é que é PODER!
Ao mesmo tempo, outras passagens me mostravam um Jesus extremamente HUMILDE! Como aquela de Ap 3.20. Depois fui saber que no contexto, Jesus se dirige a crentes. Mas naquela época eu não estava muito interessado em exegese. Seja como for, aquelas palavras me causaram grande impacto. O próprio Jesus, batendo à minha porta, esperando que eu abra?
Como pode uma pessoa ser tão poderosa e tão humilde ao mesmo tempo? Isso não existe no mundo! Os poderosos são arrogantes e os humildes não têm poder.
Aos poucos, o pequeno conhecimento que passei a ter de Jesus Cristo foi se transformando em SIMPATIA. E a simpatia foi se tornando ADMIRAÇÃO.
De uma forma suave e praticamente sem perceber, eu ja estava no ponto de reconhecer Jesus Cristo como Aquele que tinha as respostas para as minhas perguntas, a solução para as minhas angústias, a vida eterna para a minha alma.
Ou seja, minha admiração estava evoluindo para ADORAÇÃO.
Faltava assumir perante mim mesmo e o mundo, que eu estava disposto a me render ao domínio de Cristo.
E entrei numa fase difícil. Vários obstáculos surgiram.
Eu fumava desde os quatorze anos e não achava agradável a idéia de ter de parar. Minha vida social, meu círculo de amizades, meus costumes, tudo isso sofreria profundas modificações.
Apesar do Haroldo me garantir que nada isso impediria a minha salvação, eu sabia que grande parte da minha liberdade pessoal estaria seriamente restringida.
Eu sempre fora do tipo de querer fazer exatamente o que gostava. Não gostava de regras e limitações. Eu sempre vivera em torno de mim mesmo, defendendo os meus próprios interesses e agradando o meu próprio ego.
Mas para ganhar a salvação, eu sabia que teria de convidar Cristo a ser o centro da minha vida, ou seja, ocupar o lugar que até então era exclusivamente meu. E abrir mão disso estava sendo uma decisão difícil.
Hoje eu sei que tudo isso era trabalho do inimigo, que estava incomodado e trabalhando ativamente para não perder aquela alma escrava. Mas felizmente não era eu que tinha escolhido Deus para ser meu Pai, mas Ele é que tinha escolhido a mim para ser Seu filho.
Jesus disse que as portas do Inferno não prevaleceriam contra a Igreja dEle (Mt 16.18).
Pois Deus estava mais uma vez invadindo as portas do Inferno para libertar um pecador do império das trevas e colocar no reino do Filho do Seu Amor (Cl 1.13) e na Igreja dEle.
Um dia, em meu escritório, o Haroldo, talvez com a paciência já chegando ao fim, me disse: Olha, Mauro, tudo o que eu tinha a lhe dizer sobre as coisas básicas do Evangelho, eu já disse. É importante você tomar uma decisão. Quando alguém está com fome, não adianta ficar rodeando a mesa, cheia de comida. Enquanto não sentar e comer, a fome não passa! E foi para Iguatu.
Alguns dias depois, com aquelas palavras ainda ecoando em minha mente, saí pela manhã para o trabalho, sozinho em meu carro. De repente veio uma vontade irresistível de me entregar ao Senhor Jesus Cristo.
Naqueles momentos, Deus estava me conduzindo ao arrependimento, me dando a fé salvadora e a disposição para exercê-la em Cristo. Eu estava me tornando uma nova criatura.
Naquele instante, determinado por Deus, eu, de toda a consciência, com toda a força do meu coração, com uma sede infinita provocada pelo Espírito Santo, fui à fonte e bebi da Água da vida.
Minutos depois, ao chegar no escritório, fechei as portas e a cortina do meu gabinete, ajoelhei-me ao lado da mesa e fiz minha primeira oração como crente.
Disse ao Senhor que aquela firma, que até aquele dia tinha como objetivo principal me fazer rico, dali para a frente seria apenas um meio de sobrevivência. O alvo principal da minha vida tinha mudado: não mais ser empresário rico, mas apenas um servo fiel.
À noite telefonei para o Haroldo, em Iguatu. A ligação estava ruim. Referindo-me à frase que ele dissera alguns dias antes, eu falei: Haroldo, sentei e comi!. Ele não se lembrava e respondeu, sem compreender: “O quê?”
Após minha explicação, ele vibrou e me parabenizou.
Era setembro de 1976. Não me recordo o dia. Seja como for, bendito seja aquele dia.
Hoje, com 36 anos de convertido, ainda não consegui encontrar palavras para expressar o gozo por ser uma alma redimida pelo Salvador do mundo, um servo do Senhor dos senhores, um súdito do Rei dos reis.
Ao Deus bendito - Deus Pai, Deus Filho e Deus Espírito Santo - toda a honra e toda a glória.
- Amém -