Mt 26.69-75; Mc 14.66-72; Lc 22.55-62; Jo 18.15-18, 25-27 58 minutos 14/04/2013
Mauro Clark
(Como são várias passagens-texto, sugerimos consultuar diretamente na sua Bíblia)
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Vamos mesclar as 4 narrativas, ligeiramente diferentes entre si.
Cena em 3 atos.
1o. ato: Mc 14.66-68; Jo 18.15-17 e Mt 26.69-70
Ao lado de uma fogueira, no páteo da casa do sumo-sacerdote Caifás.
Duas observações:
1. Pedro cercou-se de má companhia para aquentar-se ao fogo: imprudência.
2. Embora estivesse perto de Jesus, seguiu-O de maneira errada, incompleta.
A criada o identifica e pergunta se ele estava com Jesus.
Diante de todos, Pedro nega Jesus, pela 1a. vez.
Imaginem o constrangimento desse pobre homem:
* Antes de tudo, pela simples mentira. A mentira maltrata um homem sério. Pedro era um homem sério.
A Bíblia proibe a mentira. Em princípio, não se deve mentir em nenhuma situação.
* Depois o constrangimento de negar alguém querido. Pedro amava a Jesus. E não somente amava, mas cria em Jesus.
Estava convicto que Jesus tinha a verdade. Ao negar Jesus, Pedro estava negando tudo o que Jesus dissera e ensinara. Como deve ter doído.
* Mas o pior mesmo deve ter sido o motivo pelo qual negara: covardia, medo.
2o. ato: Mt 26.71-72
Parece que outra criada o acusa no vestíbulo, ou alpendre.
Marcos se refere à mesma criada da primeira vez - pode ter havido mais de uma acusação para cada negativa.
Veja o detalhe: negou outra vez, e com juramento: negação mais enfática que anterior.
Talvez algo como: “Faça Deus isso ou aquilo comigo se eu estiver mentindo’.
Pedro aqui já devia ser um homem moído por dentro.
Lucas diz que entre a 2a. e a 3a. negação se passou quase uma hora. Uma hora que deve ter durado uma eternidade.
Pedro com a consciência torturando, vendo Jesus interrogado a poucos metros.
3o. ato: Jo 18.26-27a; Mt 26.73-74a.
Uma hora depois (confore Lucas), nova acusacao, agora de um parente de Malco, a quem o próprio Pedro cortara a orelha.
PARÊNTESES sobre o incidente de Malco: Lc 22.50-51; Jo 18.7-11
Três observações:
1) Pedro até que mostrou alguma coragem no início do processo, quando Judas chegou com os guardas.
2) Jesus rechaçou a atitude de Pedro na frente de todos.
Mostrava assim que o apóstolo estava na contamão dos acontecimentos, desafinado com os planos de Cristo e agindo por conta própria.
Toda vez que você agir assim, por puro ímpeto e até zelo, mas fora da vontade explícita de Deus, prepare-se para passar vergonha e vexame da parte do próprio Deus.
3) Pedro, que já estava acuado pelas duas criadas e outros, deve ter ficado apavorado com a entrada em cena de um parente de Malco.
Voltando:
De forma ainda mais enfática, além de negar e jurar, agora Pedro pragueja.
Dessa vez não deu tempo nem de Pedro pensar: o galo logo cantou.
Interessante a ênfase que todos os evangelistas dão ao canto do galo imediatamente após ou mesmo antes de Pedro terminar de falar:
Mt e Jo: e imediatam. o galo cantou...
Lc: e imediatam., estando ele ainda a falar, cantou o galo
Mc: nesse instante o galo cantou pela 2a. vez (narrativa com mais detalhes)
Talvez a profecia cumprida em tempo mais rápido na Bíblia.
Coitado de Pedro: há poucas horas dizendo que poderia ser preso e até morrer com Jesus, agora o nega, irritado, jurando.
E assim se cumpria exatamente o que o Jesus dissera.
Duas observações:
1. Jesus disse que Pedro O negaria, e Pedro insistiu que não.
Quem conhecia melhor a Pedro? Ele próprio ou Jesus?
Por mais íntimo que seja, ninguém conhece lhe melhor do que você próprio.
Mas obviamente deveria haber um exceção: quem lhe criou!
Só que somos tão egoístas que não estamos abertos a essa exceção evidente.
E nos recusamos a reconhecer que o Criador nos conheça melhor do que nós mesmos.
E por essa recusa pagamos um preço alto. Como Pedro pagou.
Quando o crente finalmente aceita isso e se rende, que alívio! Entrega-se nas mãos de Deus, deixa que o Espírito Santo conduza tudo!
Discordo da placa “Deus é meu co-piloto.” Deus é o piloto, o comandante!
2. Se Pedro não tivesse falado tanto, não teria passado por tanto constrangimento.
Evite falar demais. Seja prudente: Pv 13.3; 21.23.
Mas a história não terminou. E o desfecho é muito tocante.
Lc 22.60-62
É tão viva e dramática a cena das 3 negações de Pedro, que Cristo fica em 2o. plano.
E de repente Lucas nos lembra que Ele estava bem ali, talvez a poucos metros.
Cristo olha para Pedro. Pedro olha para Cristo. E desmorona. Sai e chora amargamente.
Sempre me impressionou o que devia estar contido naquel olhar de Cristo.
Final: carta a Cristo: Meu amado Mestre:
Após ter sido negado pela terceira vez, Tu, preso e amarrado, voltando-se, fixaste os olhos em Pedro. Sinto-me profundamente tocado, Senhor, cada vez que imagino aquele Teu olhar.
Um olhar de poucos segundos, mas infinito. Será que algum homem já carregou nos olhos tanta expressividade, tanta emoção, tanta coisa a dizer?
Penso que o Teu olhar foi uma dura repreensão à impulsividade crônica daquele apóstolo, sempre falador, gabola, exagerado. Poucas horas antes ele se colocara acima dos colegas, dizendo-se que jamais Tu serias tropeço para ele, mesmo que viesse a ser para os outros. Predisseste então que ele Te negaria três vezes. Ele rebateu, dizendo que estava pronto para ir contigo tanto para a prisão como para a morte e que jamais Te negaria. Que papelão! Com os olhos, de repente Tu o despiste de toda aquela arrogância, deixando corado de vergonha o seu coração e fazendo o seu ego murchar como folha sêca.
Além da repreensão disciplinar, de mestre para discípulo, fico pensando na carga de decepção contida no Teu olhar. Tanto tempo juntos, experiências espirituais de toda ordem, instruções, doutrinas, milagres, refeições, pescarias, caminhadas, tempestades em mar aberto, tudo isso serviu para solidificar uma íntima amizade entre Tu e aquele rude pescador que Te queria tanto. Mas na hora de provar a genuinidade dessa admiração, Teu amigo falha. E falha feio. Essa decepção deve ter partido de Teus olhos como flecha aguda, passado pelos de Pedro e atingido em cheio a sua consciência já pesada pela infidelidade e covardia.
Mas creio que o Teu olhar ainda tinha mais a transmitir. O fato de Pedro estar Te acompanhando pelo menos à distância deve ter sido um apoio em momentos tão cruéis, em que quase todos tinham desertado. Penso então na tristeza profunda que deve ter invadido a Tua alma santa ao se ver agora abandonado até mesmo por Pedro, e de forma tão chocante. A um passo de morrer por cada um dos Teus discípulos, Tu ouves Pedro, o mais proeminente entre eles, com medo ou vergonha de dizer que ao menos Te conhecia...
Fico pensando se aquele olhar não transmitia também grave preocupação com o futuro da Tua Igreja, em vias de ser fundada. Há pouco tempo Tu tinhas falado que Pedro teria uma posição importantíssima naquele arrojado projeto. E agora Tu Te vês brutalmente negado pelo próprio líder!
Mas por que um olhar dirigido a Pedro, dois mil anos atrás, me constrange tanto? Tenho que concluir, Senhor, que quando leio aquele trecho, aquele Teu olhar salta da página impressa, atravessa séculos e vem atingir em cheio os olhos de um pobre servo que, como Pedro, também Te ama muito, mas é igualmente cheio de fraquezas. Sim, Senhor Jesus, aquele Teu olhar é para mim, hoje, agora.
Se Pedro foi silenciosamente repreendido, por que não o seria eu, que não sou uma grama melhor do que ele? O que faço com toda a minha arrogância, com todas as minhas palavras fúteis, com toda a minha fachada de coragem e intrepidez? Ah, Senhor, eu baixo os meus olhos e também me sinto murcho.
Quantas vezes já Te fui infiel, já me intimidei de falar claramente Teu nome em momentos críticos, falhei em levantar a Tua bandeira na altura necessária, não consegui me identificar contigo o suficiente perante o mundo? Ah, Senhor, também mereço um olhar de decepção.
Por essas e outras mais, já devo ter Te dado muita tristeza. Morreste naquela cruz por mim e eu mal consigo viver para Ti.
E a preocupação que devo Te causar constantemente? Tirando por mim, responsável por uma parte de Teu rebanho, pregador e escritor, o que se concluiria da pureza, da dignidade, da nobreza da Tua Igreja? Pouco, Senhor, muito pouco.
Mas eu sei que o Teu olhar a Pedro continha ainda um outro elemento, característica básica da Tua Pessoa. Estou falando do amor, Senhor Jesus, do amor que transbordava de Teus olhos, que fluía da Tua boca, que transpirava pelos Teus poros, que emanava do Teu Ser.
Não creio que a decepção ou a tristeza contida em Teu olhar levasse o rude pescador a chorar amargamente. Imagino que tenha sido exatamente o amor — transportado dos Teus olhos para o coração de Pedro — que desestruturaram o equilíbrio emocional do apóstolo. Após tamanho deslize, merecia ele tanto amor? Não, não merecia. Mas Teu amor nunca foi baseado em merecimento.
É neste ponto que me junto a Pedro, Senhor, completamente sem jeito de ser alvo de tanto amor da Tua parte. Interessante é que eu nunca vi os Teus olhos, como Pedro, mas vejo o Teu olhar e recebo o Teu amor com a mesma força e intensidade que ele. É que Teu Espírito faz dentro de mim um trabalho magnífico, Te substituindo de forma perfeita e Te fazendo tão real a mim como se eu estivesse frente a frente a Ti, em Israel, dois mil anos atrás.
Pois é esse amor, Senhor, que não me deixa desanimar, que me faz prosseguir mesmo com todas as falhas. Esse amor, Senhor, me convence que de fato sou filho de Deus, que sou salvo por Ti, que sou amado. É esse amor, Senhor, que me faz viver.
Muito obrigado por esse amor.
Teu discípulo.
Além das lições já vimos, encerro com mais uma:
O choro de Pedro mostrou remorso, arrependimento. Enquanto alguém mostrar isso para Cristo nunca faltará amor, compaixão, misericórdia da parte dEle.
Amigo, vá a Cristo arrependido, humilde, contrito e peça perdão.
E você, crente, no dia-a-dia com Cristo nunca se arrogue ser o que não é, seja humilde.
Que Deus nos abençoe. Amém